quinta-feira, 19 de junho de 2014

A MORTE DA VIDENTE


Ananias levou um choque no meio da rua

-Deixa eu dizer seu futuro!

Parou estarrecido diante da vidente

Não podia ouvir tal palavra

Tinha medo

Adiante via sempre o dobrar de seu passado trágico

A imagem do avô chaguento aproximava-se dele

Como aparecera no pai no Jequitinhonha de fome

Era também o destino de seu filho no sertão de Minas

Onde não ia há três anos por não ter como

Nem nunca lhe mandava para comida

Fugiu para São Paulo como quem foge do Demônio

Para morar debaixo do Elevado e nos albergues públicos



A mulher pegou-lhe no braço duro e insistiu

-Agora vou revelar seu futuro

Ananias quis fugir mas as pernas não obedeceram

-Seu futuro...

A vidente notou o seu desespero e tomou mais fôlego

-Seu futuro está muito escuro...

-Ananias deu um impulso mas as pernas continuavam paralisadas

Ao mover-se sentiu a ponta do punhal na cintura

-Seu futuro...

A palavra esticava-se ouvido adentro:

Seu futurooo...

 

Ananias sentiu o gelo das pernas que subia pela espinha

A mão foi de súbito à cintura e levou o punhal ao peito da vidente

 

Ambos caíram

 

Ela foi levada ao hospital, onde morreu logo

Ele foi jogado na viatura e acordou preso
 
Elói Alves
 

 
Primeiro capítulo do romance As pílulas do santo Cristo:

 

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