"Liberdade completa ninguém
desfruta: Começamos oprimidos pela sintaxe e acabamos às voltas com a Delegacia
de Ordem Pública e Social"
Graciliano Ramos
O governo tratou de organizar a educação
de cima para baixo, mas sem envolver uma grande mobilização da sociedade.
Boris
Fausto
Todas as iniciativas da chamada reforma
educacional realista, por exemplo a de Montessori, no fundo eram hostis à
imaginação. Elas conduzem a uma aridez e até mesmo a um emburrecimento a que
precisamos nos opor.
Theodor
Adorno
Introdução.
Várias obras do escritor alagoano
Graciliano Ramos têm sido importantes fontes para os estudos feitos por
destacados pesquisadores que se inclinam a verificar como os mais destacados
literatos brasileiros viram o Brasil a sua época. Assim, por exemplo, com O
Brasil de Rosa, Luiz Roncari procura discutir algumas obras de Guimarães
Rosa como as de um intérprete do Brasil, de forma peculiar que apreciou
os costumes da vida pública junto aos da vida privada e a gestação de seus
paradigmas.
Já Willi Bolle, em grandesertao.br,
trabalha a obra prima de Rosa, Grande sertão: veredas, com uma reescrita
crítica de Os sertões, de Euclides da Cunha, escritor brasileiro
que observou in loco o extermínio do povoado de Canudos, liderado
por Antônio Maciel, o conselheiro, no final do século XIX. Nesse sentido,
considerado por muitos como a obra prima de Graciliano, São Bernardo
(1334) tem importância impar na interpretação do Brasil por volta da década de
1930.
No estudo do retrato montado por
Graciliano Ramos não se pode desprezar as questões históricas que caracterizam
o país nas primeiras décadas de sua República, tampouco a economia, por meio das
atividades que a alavancam, a política ou outras questões sociais como parte da composição que dá, no romance, a ideia de totalidade. Aí, no interior
desses aspectos, encontra-se também a educação, questão fundamental a este
trabalho. Nela é importante notar como a escola é retratada na obra, quais o
valor e função da educação que permeiam a obra, ou quais são eles,
considerando-se olhares diversos dos personagens que se confrontam ao longo do
romance, como o de Paulo Honório, proprietário da fazenda, à qual imprime
um ritmo de produção violento e mantém uma relação de reificação com as pessoas
que o cercam e o de sua mulher, professora com tendência à socialização dos
lucros, ao revés da postura do marido.
Ainda, dentro da noção de educação que se quer
discutir na obra, é importante observar no quadro das personagens a figura de
Padilha, o mestre-escola escolhido por Honório. A afirmação do latifundiário
segundo a qual “o governador se contentaria se a escola produzisse alguns
indivíduos capazes de tirar o título de eleitor” (p. 20) oferece já boa noção
de como Paulo Honório trata o assunto. Para auxiliar e embasar melhor as
discussões da obra de Graciliano acima será de relevante importância sua obra
de cunho histórico e testemunhal, Memórias do cárcere, em que o autor
relata aspectos importantes de sua passagem pelo cargo público de “diretor de
instrução pública" (1933-1936).
A
propósito das questões acima, alguns textos que tratam do tema sobre educação
são trazidos ao trabalho. Assim, “Educação para quê?” e outros, do livro
Educação e emancipação, de Theodor Adorno, Revista de educação A E C (DEZ. DE
1996) são citados ipsis litteris. Também serão usados outros estudos
sobre a obra de Graciliano, como Ficção e confissão de A. Cândido, o
ensaio crítico “O mundo à revelia”, de Lafetá. Outros textos ou são referidos
no corpo do trabalho ou o são na bibliografia na última página.
São Bernardo: o latifúndio e o lucro
Para mim São Bernardo era o lugar mais importante do mundo
Paulo
Honório
Em São Bernardo, romance de Graciliano
Ramos, escrito em 1933 e publicado em 1934, tem-se a representação do
latifúndio peculiar e típico do Brasil à época das primeiras décadas da República brasileira. Superando o modelo de administração patriarcal e o sistema
rudimentar de produção agrícola característico da monocultura de produção,
utilizando já mão de obra assalariada com divisão regulada do trabalho e
empregando um diversificado e pesado maquinário, o proprietário imprime um
ritmo veloz e firme em seu sistema de produção destinada ao lucro, inserindo-se
assim nos contextos do capitalismo de então.
Para o antigo proprietário que a herdara
do pai, a fazenda só tinha valor sentimental. Tendo-a adquirido, Paulo Honório
faz melhorias e investimentos diversos. Açude, pomar, criação de galinhas
orpington, gados, o limosino, o Shuitz, pomicultura, avicultura, plantações de
algodão e mamona, serraria, dínamo, pedreira, descaroçador, prensa, banheiro
carrapaticida, telefone, eletricidade, casas para os empregados, automóvel, a
estrada de rodagem construída sem ajuda do governo, igreja, gados, estradas
asfaltadas etc.
O sistema de produção é diversificado e
todo seu mecanismo busca um enquadramento no sistema econômico cujo objetivo é
o acúmulo de capital, por meio de uma propriedade “regular”, num vocábulo
recorrente de seu proprietário. Somados todos esses aspectos, pode-se, pois,
antever um caráter simbólico de modernização encarnado pelo proprietário de São
Bernardo.
Não
obstante, nesse modelo de proprietário há a figura do coronel regional, com
votos contados para o partido, cercado de capangas e que decide até onde vão os
limites de suas terras, onde fazer suas cercas, a quem destinar proteção e o
que fazer com seus inimigos, que, deliberadamente, nada mais é que eliminá-los
ou subjugá-los.
Considerações sobre Paulo Honório.
Paulo Honório é um homem de experiências
brutas. Sua história é contada de um modo direto, sem voltas e sem remorsos,
percebendo-se já em sua narrativa uma analogia de seu modo de agir com as
pessoas e as coisas. No terceiro capítulo o narrador volta cinquenta anos na
linha do tempo e relata por cima os acontecimentos que julga mais decisivos
para que o leitor crie a imagem dele. A vida de misérias na infância, trabalhos
forçados, negócios e violências no sertão, o crime que o deteve na cadeia por
“três anos, nove meses e quinze dias”, onde aprendera a ler “na bíblia dos
bodes”. “Sei lá como principiei!”- diz ele à mulher. "Quando dei por mim,
era guia de cego. Depois vendi as cocadas da velha Margarida” (p.115).
Embora alegue dificuldades e até
fraquezas, Paulo Honório se mostra intrépido diante dos obstáculos, não temendo
quaisquer perigos. Honório é a representação dos tempos novos que trazem a
renovação, vencendo a estagnação de tipo vário, como econômica e técnica, e
atropelando obstáculos. Em seu ensaio “O MUNDO À REVELIA” (pós-fácio à edição
Record, 51 edição) joão Luiz Lafetá escreve:
Paulo
Honório, representante da modernidade que entra no sertão brasileiro, é o
emblema complexo e contraditório do capitalismo nascente, empreendedor, cruel,
que não vacila diante dos meios e se apossa do que tem pela frente dinâmico e
transformador.
Ora, é essa a impressão mais forte que se
pode extrair do caráter de Honório, das ações que vão dando ideia da composição
desse ethos. Assim, vai-se deflagrar a postura reificadora dele para com
as demais pessoas de sua convivência e com ela sua perspectiva nas relações
humanas e, por consequência, nas questões sociais como a educação.
Considerações sobre Madalena.
Madalena surge, no romance, no momento em
que a posse de São Bernardo está totalmente concluída e sua engrenagem em pleno
funcionamento. Professora de “primeira entrância”, vinda da “escola normal”,
Madalena fora criada pela tia enfrentando dificuldades e privações. Após uma
das brigas, relata parte de sua história, como peça de defesa da tia:
Morávamos
em casa de jogador de espada, disse Madalena. Havia duas cadeiras. Se chegava
visita, d. Glória sentava-se num caixão de querosene. A saleta de jantar era
meu gabinete de estudo. A mesa tinha uma perna quebrada e encostava-se à
parede. Trabalhei ali muitos anos. À noite baixava a luz do candeeiro, por
economia. D. Gloria ia para a cozinha resmungar, chorar, lastimar-se. O hábito
que ela tem de cochichar vem desse tempo. Dormíamos as duas numa cama estreita.
Se eu adoecia, d. Glória passava a noite sentada; quando não aguentava de sono,
deitava-se no chão (p. 116).
Sua primeira menção no romance vem a
propósito de uma conversa de homens ociosos: “No outro dia, de volta do campo
encontrei no alpendre João Nogueira, Padilha e Azevedo Gondim elogia umas
pernas e uns peitos” (45). A formação de Madalena, sua visão de mundo, seu modo
de se relacionar com os outros, o oficio de escrever para o jornal, não tendo
espaço em primeiro plano, vão depois ser rechaçados por completo.
A origem da escola
O primeiro aspecto sobre a escola em São
Bernardo que se torna chamativo é o que a aponta como uma instituição tardia
que não acompanha o desenvolvimento de nenhuma outra atividade da fazenda.
Parece algo despropositado. Alíás, pelo modo de ver de Paulo Honório, ela é
mesmo algo arbitrário para a fazenda, e o é, a efeito, pelo sentido que lhe
atribui. Sua necessidade e sua exigência só são sentidas por ocasião da visita
do governador: “O governador gostou do pomar, das galinhas Orpington, do
algodão e da mamona, achou conveniente o gado limosino, pediu-me fotografias e
perguntou onde ficava a escola. Respondi que não ficava em parte nenhuma” (p.
43).
Seu surgimento, embora necessário, mostra
bastante algo de adventício, desvinculando-se de tudo mais nos termos da
propriedade. Além do que essa necessidade é sentida por alguém que vem de fora,
sem uma profunda legitimação do poder interno, o que a confirma como algo
desprivilegiado ali. As razões da negligência com a existência da escola são
percebidas no fluxo de consciência, visto por meio da narrativa. “No almoço que
teve champanhe, o dr. Magalhães gemeu um discurso. S. exa. tornou a falar na
escola. Tive vontade de dar uns apartes, mas contive-me”.“Escola! Que me
importava que os outros soubessem ler ou fossem analfabetos” (p.44).
No entanto, a razão mais contundente desse
modo de enfrentar essa questão só se esclarece à luz de uma ideia rentável.
"Fui mostrar ao ilustre hóspede a serraria, o descaroçador e o estábulo.
Expliquei em resumo a prensa, o dínamo, as serras e o banheiro carrapaticida.
De repente supus que a escola poderia trazer a benevolência do governador para
certos favores que eu tencionava solicitar. -Pois sim
senhor. Quando V. exa. vier aqui outra vez, encontrará essa gente aprendendo
cartilha.” (p.44).
A propósito desse assunto, a “invenção de
um espaço de ensino”, vem abaixo um excerto da professora Magda Soares:
"A
diferença fundamental entre o aprendizado corporativo medieval e o aprendizado
escolar que se difundiu no mundo ocidental a partir sobretudo do século XVI
foi, segundo Petitat, “uma revolução do espaço de ensino, pela substituição dos
locais dispersos mantidos por professores ‘independentes’ por um prédio único
abrigando várias salas de aula’; como consequência e exigência dessa invenção
de um espaço de ensino, uma outra “invenção” surge: um tempo de ensino – “uma
vez os alunos encerrados num grande espaço, a ideia de sistematizar o seu tempo
iria se desenvolver”, ideia que se materializou não apenas numa organização e
planejamento das atividades, mas estendeu-se ao próprio conhecimento a ser
ensinado e aprendido. “resultando numa gradação sistemática e numa divisão
correspondente das matérias” (Petitat, 1992:144). É assim que surgem os
graus escolares, as séries, as classes, o curriculum, as matérias e
disciplinas, os programas, em fim, aquilo que constitui até hoje a essência da
escola. (REVISTA DE EDUCAÇÃO AEC, out/ dez. de1996, p. 9-10)
O caráter histórico das transformações do
espaço escolar apontado no excerto acima aparece apenas em parte na escola que
aparece no romance. Devido a sua inserção no tempo histórico e também a noção
de totalidade dentro da necessidade de uma propriedade moderna, a escola tende
a cumprir alguma especificidade. Não obstante às definições de local, isto é, o
espaço de ensino, a disciplina escolar dada, ou, nas palavras de Honório, a
“cartilha” etc, as dívidas diante das exigências educacionais são grandes e mesmo
insuperáveis, devido exatamente ao espírito conceitual que lhes dá origem. “__ Esses
homens do governo têm um parafuso frouxo. Metam pessoal letrado na apanha da
mamona. Hão de ver a colheita” (p.44), afirma o proprietário de São
Bernardo.
O estatuto da escola da fazenda só pode
ser lido a partir de um conhecimento prévio do ethos ou do tipo de homem
que é Paulo Honório, seu fundador e proprietário. Centralizador e autoritário, busca uma racionalização máxima de todas as atividades em suas terras. A
primeira conversa dele com a professora que seria sua esposa parece bastante
ilustradora das diferenças de concepção de mundo e, conseqüentemente, como
ambos veem o homem. “Na estação d. Glória apresentou-me a sobrinha, que tinha
ido recebê-la. Atrapalhei-me (...). __ D. Marcela disse-me que o senhor
tem uma propriedade bonita, começou Madalena”. “__ Bonita? Ainda não reparei.
Talvez seja bonita. O que sei é que é uma propriedade regular” (p.81).
A racionalização típica do sistema de
produção “regular” que se busca ali implica também o modo de tratamento
destinado aos homens. Neste ponto parece adequado notar o sentimento que
Honório nutre em relação ao que há no mundo. Antônio Candido vê nisto uma
patogênese:
Paulo
Honório, por sua vez, é a modalidade duma força que o transcende e em função da
qual vive: o sentimento de propriedade. E o romance é, mais que um estudo
analítico, verdadeira patogênese desse sentimento. De guia de cego, filho de
pais incógnitos, criado pela preta Margarida, Paulo Honório se elevou a grande
fazendeiro, respeitado e temido, graças à tenacidade infatigável com que
manobrou a vida, pisando escrúpulos e visando o alvo por todos os meios (Ficção
e confissão, Ensaios sobre a obra de Graciliano ramos, p. 25-26).
Essa postura, esse modus vivendi, em
modelo acabado, transforma-se numa ética humanamente bastante cruel que é, em
essência, uma postura reificadora, que busca a transformação de pessoas em
coisas. O fragmento abaixo mostra bem esse comportamento do fazendeiro:
Uma tarde
subi à torre da igreja e fui ver Marciano procurar corujas. Algumas se haviam
alojado no forro, e à noite era cada pio de rebentar os ouvidos da gente. Eu
desejava assistir à extinção daquelas aves amaldiçoadas. (..) Ali pelos cafus
desci as escadas, bastante satisfeito. Apesar de ser indivíduo medianamente
impressionável, convenci-me de que este mundo não era mau. Quinze metros acima
do solo, experimentamos a vaga sensação de ter crescido quinze metros. E
quando, assim agigantados, vemos rebanhos numerosos a nossos pés, plantações
estirando por terras largas, tudo nosso, e avistamos a fumaça que se eleva de
casas nossas, onde vive gente que nos teme, respeita e talvez até nos ame,
porque depende de nós, uma grande serenidade os envolve. Sentimo-nos bons,
sentimo-nos fortes. E se há ali perto inimigos morrendo, sejam embora inimigos
de pouca monta que um moleque devasta a cacete, a convicção que temos da nossa
fortaleza torna-se estável e aumenta. Diante disto, uma boneca traçando linhas
invisíveis num papel apenas visível merece pequena consideração (p. 156).
É interessante pensar como esse
comportamento tão desprovido de sensibilidade se aflora quando o assunto exige
um olhar voltado para a qualidade da vida das pessoas, como é o caso da
educação. Um dia depois da visita do governador o mestre-escola já está
escolhido. A propósito do assunto as opiniões vão se perfilando.
__
Magnífico! Exclamou Azevedo Gondim com um sorriso que lhe achatou mais o nariz.
Aceitou o meu conselho, hem? Não há nada como a instrução”. João Nogueira,
advogado da fazenda, “passou os dedos pela testa e pressagiou, distraído, que a
escola teria grande utilidade (p. 48).
De pronto, encolhendo os ombros, Paulo
Honório dá as explicações:
__Sei lá!
Não acredito Tanto que resolvi aproveitar o Padilha. Está claro que se poderia
arranjar uma boa escola rural, com ensino razoável de agricultura e pecuária.
Mas onde vou encontrar técnicos? E que dinheirão! Por enquanto é apenas um
bocado de leitura, escrita e conta. Você estará em condições de encarregar-se
disso, Padilha? (p.48).
Herdeiro de São Bernardo, Padilha endividou-se
e acabou vendendo a propriedade. Agora escrevia alguns contos, de que se
envergonhava, para o Cruzeiro, jornal de Gondim, situacionista financiado pelo
governo. Para Honório, Padilha era apenas um “preguiçoso” a quem queria
envergonhar. Aqui tem-se o mestre escola escolhido. Um professor em quem o
próprio dono da escola não vê qualidades para o cargo. Sua escolha nada mostra
senão a própria maneira de Paulo Honório enfrentar a questão da educação. No
limite, já está presente o comprometimento do tipo de ensino que se vai
ministrar, devido justamente a uma escolha de cunho autoritário da educação dos
outros, como diz o trecho seguinte de Theodor Adorno.
Em relação
a esta questão, gostaria apenas de atentar a um momento especifico no conceito
de modelo ideal, o da heteronomia, o momento autoritário, o que é imposto a
partir do exterior. Nele existe algo de usurpatório. É de se perguntar de onde
alguém se considera no direito de decidir a respeito da orientação da educação
dos outros. As condições provenientes do mesmo plano de linguagem e de
pensamento ou de não-pensamento_ em geral também correspondem a este modo de
pensar. Encontram-se em contradição com a ideia de um homem autônomo,
emancipado, conforme a formulação definitiva de Kant na exigência de que os
homens tenham que se libertar de sua auto-inculpável menoridade ( Educação e
emancipação, p.141).
Padilha de fato não é nenhum entusiasta da
causa da educação. A primeira e única coisa pela qual perguntou foi a
remuneração. “Luiz Padilha informou-se do ordenado e declarou que vivia cheio
de ocupações” (48). Acaba ficando, por não ter o que fazer. Aqui, toca-se no,
por assim dizer, calcanhar de Aquiles da profissão, que é a questão salarial.
Madalena recebia como professora de “primeira entrância” um salário de cento e
oitenta mil (180 000) reis. Mestre Caetano que trabalhava quebrando pedras na
fazenda recebia mais de três vezes a mais, exatamente seiscentos mil (600 000).
Paulo Honório informando-se do ordenado da professora responde em tom de despropósito.
“Criem Galinhas!” Para quem todas as atividades se reduzem ao lucro, não há
sentido numa profissão dessas.
A ruptura decisiva entre a professora e
fazendeiro se dá exatamente quando decidem se unir nos laços estreitos do
casamento. O modo de ser simples e humanitário de Madalena nada tem a ver com o
de seu marido. No fundo ela tinha grande compaixão pelas pessoas que
trabalhavam e moravam na fazenda. O Lado humano e ao mesmo tempo o desespero de
Madalena aparecem durante o espancamento de Marciano por Paulo Honório: “É
horrível Bradou Madalena (...) __ Ah! Sim! Por causa do Marciano. Pensei que
fosse coisa séria. Assustou- me.” Diz Honório.”
Nos termos de suas terras, Paulo Honório
nunca vê o homem, o ser humana em sua essência.Logo todo o tratamento que lhe
dirige é ipso facto autoritário. Não poderia, assim, existir ali uma educação
voltada para aspectos de valorização da vida em seus meios mais elementares. Um
tipo de educação nesses termos tem sido uma carência dos tempos modernos. Nesse
sentido a obra de Graciliano é tanto verossímil como uma obra histórica. Tanto
no âmbito federal, com o regime de Vargas por quem Gracilino fora preso, como
regionalmente, o século vinte foi infelizmente uma época de opressão ao homem e
à educação e cultura. O professor Francisco Monforte, ex-ministro da cultura
fala baixo sobre esse aspecto:
Se no
universo da cultura o centro está em toda parte, o centro da cultura é o homem.
(...) uma inspiração humanística e democrática. Mas creio que as relações entre
educação em cultura vem sendo empobrecidas, por uma visão supostamente moderna (
Guia de cultura da Universidade de São Paulo, maio de 2007, p.16).
É exatamente este aspecto que afasta
educação e cultura em função de algo pretensamente objetivo ou funcional, sendo
um importante mecanismo que emperra o aspecto humano tão fundamental em
educação.
Elói
Alves