quarta-feira, 23 de maio de 2012

AS RELAÇÕES ENTRE CAPITAL E TRABALHO NO BRASIL

Epígrafe: "O dinheiro que compra o pão dos pobres comprou antes o divertimento dos abastados" Machado de Assis

A relação capital/trabalho no Brasil não pode ser bem analisada sem um olhar que se dirija às suas contradições históricas, cujas origens vão lá séculos atrás, no período da colonização portuguesa. Neste contexto amplo é que se deu o formato rigoroso de suas relações, excludente e limitador, por um lado, e lucrativo e opressor, de outro.
Primeiramente, ao observar as implicações entre trabalho e lucro na formação de nossas relações, deve-se ter em conta o modelo rígido das condições impostas, com funções definidas como imutáveis que, passando pelo uso do escravo como meio de produção não-remunerável no latifúndio, objetivava, ao fim, apenas o lucro do senhor proprietário do engenho de açúcar e os tributos da Metrópole.
As mudanças no sistema político ocorridas no país, mesmo gerando expectativas, não produziram reformas na estrutura das relações entre capital e trabalho. Isto é, o trabalhador das fábricas, substituindo os escravos, não retiram do que produzem o mínimo para uma alimentação digna e para um básico cuidado do corpo, com o qual “fabricam” o lucro para os ocupantes do lugar dos senhores de engenho, que são, hoje, os empresários.
Desse modo, às mudanças políticas da sociedade brasileira, das recentes às mais remotas, jamais corresponderam quaisquer tipos de reformulação na estrutura das relações de trabalho e destinação do lucro, que continua, portanto, fundada na exploração e exclusão de uns, ou seja, dos trabalhadores (a maioria), e no enriquecimento de outros (a minoria), que são os ocupantes das classes abastadas, que decidem junto ao governo os destinos de todos os demais.
Elói Alves

domingo, 20 de maio de 2012

ODORES DA CIDADE

   


Não quero ser preso por fazer apologia dos cheiros, mas nossa cidade tem cheiro para todos os gostos - e para todos os desgostos também.
         À entrada do shopping, a moça da loja de perfumes me convida, destacando mais sua beleza na simpatia do belo sorriso:
        -Quer sentir?
      -Sim, obrigado! - respondi, recebendo dela um pedacinho de papel perfumado.
          O dela parecia mais agradável, dizia-me o meu olfato, comparando-o com a fragrância impregnada no papelzinho.
Trouxe-o comigo ainda por algum tempo, enquanto andava vagorosamente pela cidade. E meu olfato insistia sempre na comparação.
  -Qual seria o perfume dela, perguntei-me, por fim?
Minhas reflexões foram interrompidas bruscamente pela fumaça do cigarro de uma mulher que veio olhar uma vitrine da loja de joias ao meu lado. Tentei ainda olhar uma flor coberta por ouro, mas meus pés ligeiros foram embora, na intriga dos sentidos, arrastando meus olhos que insistiam em olhar aquela bela flor, tão ricamente dourada.
      Ao meio dia, fui encontrar ao pé do Teatro Municipal meu amigo Edu Moreira, que chegara de Portugal com novidades literárias. 
      -O velho continente continua lindo e pomposo - disse-me entre conversas diversas. Vamos sentar que quero lhe mostrar uma relíquia de Antero de Quental.
      Estávamos na rua Formosa, no Vale do Anhangabaú, peripateteando, quando achamos uns bancos solitários em meio aos transeuntes.
      Antes de sentar, verifiquei que estavam sujos e atravessamos a calçada em direção a uns assentos no lado oposto.
  -O cheiro aqui não anda agradável, disse-me o Edu.
       -E olha que o caminhão-pipa limpa isso todas as manhãs, com jatos fortíssimos. Vejo-o de minha janela todos os dias.
     Fomos andando, cruzando o Vale em direção ao Mosteiro quando um leve vento espalhou pelo ar, mesclada às aromáticas sensações vindas das árvores de eucaliptos, a notificação de que fumavam livremente cigarros artesanais e proibidos. Mais à frente, a improvisação de um sanitário em espaço aberto misturou o cheiro de suas defecações com o da erva tragada. E subiam aos nossos narizes como incenso inaceitável. Não éramos deuses, certamente, para receber aquela estupenda oferenda!
       Na Líbero Badaró fomos, no entanto, agraciados com os perfumes mais agradáveis que usavam os transeuntes em passeio na hora do almoço. Além do perfume, a elegância e a beleza lutavam para limpar minha mente dos odores maléficos. Para, ao fim, se dizer: “Compensa!”
       Mas, infelizmente, com tantos perfumes, não sei com qual deles, minha alergia atacou-se. Almocei mais rápido que do costume, agradeci ao Edu sua gentileza e voltei para meu apartamento, para purificar-me sob as intensas águas do meu inodoro chuveiro.
Elói Alves



Leia o primeiro capítulo de As pílulas do Santo Cristo romance de Eloi Alves:
http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/10/as-pilulas-do-santo-cristo-1-capitulo.html



Abaixo, pode-se ler também o prefácio feito pelo escritor e mestre em Literautra Comparada pela FFLCH-USP prof. Edu Moreira: http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/11/prefacio-de-as-pilulas-do-santo-cristo.html


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