quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

SOBRE O FECHAMENTO DA LIVRARIA CAMÕES E O VALOR DA CULTURA

A livraria Camões está fechando suas portas no Rio de Janeiro após quarenta anos voltada à literatura, à cultura e à arte em geral.
A notícia naturalmente não é boa, mas é uma evidência. Há alguns anos, recebi uma notícia de igual peso: era o fechamento da livraria Duas Cidades, em São Paulo. Ocorreu em setembro de 2006. Corri até a rua Bento Freitas para dar a última olhada, e comprei um livro de Walter Benjamin que guardo comigo, pelo valor da própria obra e como lembrança da livraria, que foi palco de encontro de grandes autores, como Antônio Cândido, Alfredo Bosi, Celso Lafer com leitores ávidos de cultura, que, percentualmente, não são muitos no Brasil.
Não irei abordar a crise econômica que afeta a Europa e todo o mundo de alguma forma. Mas sim o fato de que, infelizemente, não temos em nosso país o gosto pelo saber, pela continuidade da educação pessoal e familiar, numa dedicação voltada à mudança e avanços contínuos. Há uma infeliz inversão que valoriza a mediocridade generalizada e até a idolatra quando ganha espaço e notoriedade orgulhosa. Alíás, a mediocridade tornou-se no mundo atual, não só no Brasil, uma luz na escuridão dos milhões de esquecidos e sem oportunidades. E no Brasil, uma país com mais de cem anos de atraso em educação e com IDH (índice de desenvolvimento humano) entre os piores do mundo, a saída de mergência não é mesmo a cultura e a educação de qualidade e as mudanças pela via da reflexão aguda e do conhecimento apurado. O Brasil é o país do discurso e do bla-bla-bla_ que é até exportado_ e não da cultura como caminho de transformação contínua do homem e do mundo.
Elói Alves

domingo, 15 de janeiro de 2012

AZIRALDO, O AZARADO

Chamam-me Aziraldo e estou agora de férias e em repouso. E meu repouso agora se estenderá para além dos meus dias de folga.
Mas acham que estou sob meus planos? Pois que não. Se querem saber quais eram, já lhes digo: ia à praia, escrever uns sonetos na areia.
Mas eis que choveu no primeiro dia. E choveu a tal ponto que recolhi as malas a um canto e fui à janela ver se passava. Mas as ruas foram se enchendo, mais e mais. No segundo e no terceiro dia pouco mudou. Parava a chuva, vinha a garoa. Cessava o trovão, vinham os raios.
-Que venha o dilúvio, seu São Noé!
Mudei de planos: fui à estante e peguei de um livro. Mas, hahhhh! Pensam que eu perco o pique? Fui atrás de umas redes que ganhei de uns índios quando fui anos atrás à Amazônia. Coisas boas e invejáveis! Todas trançadas artisticamente no cipó. Mas onde andavam? Os cipós ainda tinham pernas.
Não perdi tempo. Fui à cama e puxei do lençol, que me veio sorrindo, malicioso. Oh, terei minha rede, pensei.
Finquei-o entre a janela, dando-lhe um nó cego, e um gancho na parede oposta. Saquei do livrinho, e para que ler..., se eu podia comtemplar a chuva e me vingar dela, superiormente?
Foi o que fiz. A tal ponto que relaxei e balancei.
Vezes e vai!
Vezes e vem!
Já chego ao Japão,
já volto ao Brasil!
Quando meu primo entrou pela sala, lancei-lhe as poesias levemente pelos ares e lhe gritei:
-Oh, Luis, vais de Camôes?
Ele não ia nem foi. Correu ao meu encontro, quando viu que o lençol se rompia, ralando na coluna da parede. E, antes de qualquer coisa, fui eu imediatamente ao chão.
Abrevio, caro amigo e simpática amiga. Escrevo-lhes do hospital. Estou de bruço e enfaixado por toda as costas, que é agora navegada por umas coceiras irritantes que não acabam nunca e que não posso coçar.
Meu primo, pensando em amenizar meus dias sobre essa cama estreita, trouxe-me as poesias de volta; porque, certamente, serviria agora mais a mim que a ele, que ia à praia, já que o sol saiu e já queima forte.
Mas espera! Deixa fazer que estou dormindo, que a enfermeira lá vem com remédio amargo e sopa sem sal.
Elói Alves

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