sábado, 29 de dezembro de 2012

O GUIA E O CEGO

        -O Senhor esteja convosco- expressou-me um cego à beira do caminho, com uma voz sem cores!
        Propus-lhe seguir como guia.
        -A estrada da esquerda é caminho das mortes- disse-me magramente.
        Os tempos não andam bem. Era melhor entrar, convidou-me à sua porta.
        -Partilhemos meu pão e um copo d`água.
        Hoje estou às apalpadelas, como ele outrora. Arrancaram-me os olhos durante as passadas, mas não me deixaram parar.
        Os ventos passam e cumprimentam-me, agarrados a distantes e frias notícias. Meu guiado já está morto. A água trazia veneno e o pão não lhe susteve a vida.
Elói Alves

Leia o primeiro capítulo de As pílulas do Santo Cristo romance de Eloi Alves:
http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/10/as-pilulas-do-santo-cristo-1-capitulo.html

Abaixo, pode-se ler também o prefácio feito pelo escritor e mestre em Literautra Comparada pela FFLCH-USP prof. Edu Moreira: http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/11/prefacio-de-as-pilulas-do-santo-cristo.html

Adquirir o livro:http://realcomarte.blogspot.com.br/p/as-pilulas-do-santo-cristo-adquiri.html

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

OS POLÍTICOS PAPAI NOEL (Perguntero)

     
       No Brasil - e também em países chamados ricos, como os EUA, em que há muitíismos pobres e mendigos pela rua e milhões de imigrantes trabalhando em regime análogo a servidão antiga, pois correm o risco de serem presos e deportados sem direito a nada - os políticos, dos mais populares e lisongeados, têm cultivado e cultuado o hábito de visitar mendigos e comunidades “carentes” e exploradas durante o natal.
      Na verdade,  a prática é muito antiga. Contam-se muitas histórias do velho Jânio Quadros se fazendo ele mesmo de pobre, caindo de fome durante as campanhas políticas. O próprio Getúlio Vargas instituiu o culto a sua pessoa com seu populismo e intitulou-se de “pai dos pobres”, como ultimamente se faz por aqui.
       Será que é o espírito natalino que enche de bondade esses nossos políticos justamente nesse dia do menino Jesus que os faz visitar os abandonados por suas políticas, os roubados pela corrupção, descuidados pela fraudes e desvios da educação ao longo de todo o ano e anos - sem tocar na robustez de nosso SUS?
       Interessante que a tarefa dos políticos não seria fácil se estivessem dispostos a visitar a todos os mendigos dos centros brasileiros, pois o número vem sempre crescendo. Até os termos, agora sociológicos, vêm se cunhando continuadamente. “Moradores de rua”, "moradores em situação de rua", "população de rua", além de mendigos, andarilhos, pedintes etc. Até as associações de moradores de rua não têm se multiplicado?
      Ora, é preciso que apareçam novos políticos, porque os que ai estão não podem dar conta de visitar tantos mendigos numa única noite natalina;  aliás não será devido a essa árdua tarefa que precisam das segundas e sextas feiras livres, além dos recessos e das visitas às suas "bases", chamadas também de "curral eleitoral"? Acho importante e chego a propor ao menino da manjedoura que envie-lhes às ruas um político que lhes sejam “o pai dos mendigos”, “o pai dos sem teto” e que seja verdadeiro, do mesmo modo como já nos tem enviado "os veradeiros amigos do pobres" e que talvez por isso seja preciso que os mantenham pobres.  Não é bom se perpetuarem as veradeiras amizades e genuínas paternidades?
      Ma peço também que não gerem muito mais do que ai estão, porque senão poderei também ter novo pai e depois de velho já me acostumei a ser órfão desses pais natalinos. Alguém ai quer um pai Noel?  Que tal todo mundo sorridente - mesmo se dentes - para uma foto com o político Noel?
Zé Nesfasto Perguntero

Leia o primeiro capítulo de As pílulas do Santo Cristo romance de Eloi Alves:
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Abaixo, pode-se ler também o prefácio feito pelo escritor e mestre em Literautra Comparada pela FFLCH-USP prof. Edu Moreira: http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/11/prefacio-de-as-pilulas-do-santo-cristo.html

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quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O FEIO NO SUPERLATIVO

     O superlativo não convém aplicar-se à feiúra, nem o analítico e tampouco o sintético, cuja compressão, neste caso, suprime a beleza que configura-se em massa, disforme e densa. Mesmo que vista-se com o disfarce eufêmico e colorido da fealdade, torna-se desumana ou no mínimo deselegante.
     Para que classificar a feiúra em graus e degraus que a intensificam mais e mais, como se ser feio estritamente já não bastasse? Para que dizer que alguém é muito feio, ou muitíssimo feio, feiíssimo?
     O superlativo tem seu assento assente nos meios denominados cultos e atribuem-se belezas e elegâncias diversas. No entanto, seu uso pode andar por via reversa. O cruel tem se tornado cruelíssimo e até de modo cru vestido-se de crudelíssimo, mas vem sempre triste, choroso e mal vestido, andarilho de via obscura.
     O nazismo, na Alemanha, o fascismo, na Itália e para onde correu depois e perambula hoje, são dessas molduras. A intensificação do adjetivo leva sempre a eterna pergunta: para que? Para que romper-se mortífero, já no desumano e em si extremado, dos venenos atômicos que emudecem a história?
     “Os pobres sempre estarão convosco”, diz Cristo aos discípulos- mas para que se fazem paupérrimos? Para que as as distâncias econômicas se agigantam tornando os miseráveis miserabilíssimos?
       A questão lingüística torna-se mera capa da essência atrofiada pela hipertrofia. Esticam-se superlativamente os mentirosos, os ratoneiros- lábio-disfarçantes- em crudelíssimos enganadores, em ancestrais do pai da mentira que incham em grau extremo as casas parlamentares e executivas, carcomidas por todos os vícios.
      A metáfora da miséria são os ossos secos que insistem em por-se de pé. Sua insistência é a pregação muda e corrosiva que penetra pela história, que tentam maquiar inutilmente os políticos com seus discursos e propagandas de “paz e amor” e promessas salvadoras. A história tem seu subsolo descolorido, impermeável às tinturarias da propaganda. Suas tintas perecem com sua passagem fétida.
     Para que roubar superlativamente um país inteiro? Infectar todo um organismo com mazelas apadrinhadas, de bocas roedoras? Por que não contentar-se com ações apenas feias? É preciso levá-las a semântica do horrendo sem abrir mão do radical?
     Sou pelo meio-termo, uma posição mediana entre o santo e o pecador: para que se vestir de deuses se sabemos- até pelo cheiro- que os diabos perfumam-se com enxofre e trazem a cara horribilíssima, maquiada superlativamente com as cores da incoerência?
Elói Alves

Leia o primeiro capítulo de As pílulas do Santo Cristo romance de Eloi Alves:
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