quinta-feira, 31 de julho de 2014

CAPA DE "SOB UM CÉU CINZENTO", MEU NOVO LIVRO

Amigos, esta é a capa de meu novo livro, Sob um céu cinzento; livro de poemas que será lançado na Bienal do livro em SP, no fim de agosto, pela LP books e que terá o posfácio da contista e professora Romy Schinzare, aquem sou muitíssimo grato.
Elói Alves

quinta-feira, 17 de julho de 2014

SERES OBSCUROS

No vaivém da noite entorpecida povoada de seres obscuros
As nuvens descem sobre as cabeças esquecidas aos pescoços duros
As consciências congeladas, como sardinha enlatada, perdem aos poucos a validade
E conformam-se como produtos da indústria gestados para o perecimento e descarte
Os cães uivam pelas ruas sujas
Um mudo mundo indistinto na escuridão indiferente nada comunica
Apenas uma surda mensagem de um vazio inglório
E os homens gemem baixamente suas vidas amarelecidas e sonolentas
Elói Alves

domingo, 29 de junho de 2014

SONHOS


Houve sonhos

Sonhara que tudo era azul

Mas nada além disso

Em seu mundo os sonhos se dissipavam

Na outra noite era outro sonho

Que também se perdia antes do dia

O sol deve espalhar os sonhos noturnos


Devia haver algo mais

Além dos sonhos azuis

Algo da esfera dos signos, corpóreo


As lembranças não alcançam o horizonte

Perdem-se no vazio da noite que passa

As imagens transfiguraram-se

Embranquecem como a própria noite no espaço


A magia sublime se faz, invisível

O nada se põe para sempre

Fragmentos do ser se diluem e revoam na névoa

A claridade sublime desperta o pó
Elói Alves

 
Sob um céu cinzento, novo livro do autor será lançado neste ano

Primeiro capítulo do romance As pílulas do santo Cristo: 

SESSÃO ENCERRADA


No Tribunal a sessão foi encerrada

Sem começar

Mas não houve nada

Apenas o medo

Do doutor

E o povo lá fora, que gritava

Clamando por uma justiça que não existia
 
Elói Alves
 
 
Sob um céu cinzento, novo livro do autor será lançado neste ano

Leia o Prefácio de Contos humanos:


domingo, 22 de junho de 2014

A HISTÓRIA DO LOUCO


A primeira vez que vi um louco eu era muito pequeno

E achava que ele era o homem mais poderoso do mundo

Ele falava com os homens da lua

E conseguia rir por muito tempo

Só ficava triste quando lhe davam remédio


Um dia ele foi levado para o hospital e não voltou mais

Mas eu me lembrava dele

Toda vez que via homens que riam
 
Elói Alves
 
Primeiro capítulo do romance As pílulas do santo Cristo:

sábado, 21 de junho de 2014

O MENINO E A PONTE


O riacho era estreito mas o leito, fundo
As águas corriam ao jorrar de nascentes vizinhas
Sobre ele vergava uma ponte de pau centenário
Que gemia ao vento prometendo cair
 
O menino não ousava transpô-la
Era o único de sua idade que ainda a temia
Atravessara-a muitas vezes ao colo do pai
Mas agora estava grande para isso
 

Numa manhã em que toda a casa ainda dormia
Levantou-se decidido e correu para a ponte
Deu o primeiro passo sem olhar para baixo
Mas estacou com as pernas trêmulas

As águas límpidas corriam alheias àqueles olhos medrosos
Ele apoiou-se com os pés e as mãos sobre a madeira
E moveu-se para frente, agachado
Vagarosamente chegou ao meio
 
Depois levantou-se olhando para frente
Deu alguns passos puxando as pernas pesadas
E logo, misturando coragem e medo
Correu para o outro lado como um furacão
Elói Alves

Primeiro capítulo do romance As pílulas do santo Cristo:




quinta-feira, 19 de junho de 2014

A MORTE DA VIDENTE


Ananias levou um choque no meio da rua

-Deixa eu dizer seu futuro!

Parou estarrecido diante da vidente

Não podia ouvir tal palavra

Tinha medo

Adiante via sempre o dobrar de seu passado trágico

A imagem do avô chaguento aproximava-se dele

Como aparecera no pai no Jequitinhonha de fome

Era também o destino de seu filho no sertão de Minas

Onde não ia há três anos por não ter como

Nem nunca lhe mandava para comida

Fugiu para São Paulo como quem foge do Demônio

Para morar debaixo do Elevado e nos albergues públicos



A mulher pegou-lhe no braço duro e insistiu

-Agora vou revelar seu futuro

Ananias quis fugir mas as pernas não obedeceram

-Seu futuro...

A vidente notou o seu desespero e tomou mais fôlego

-Seu futuro está muito escuro...

-Ananias deu um impulso mas as pernas continuavam paralisadas

Ao mover-se sentiu a ponta do punhal na cintura

-Seu futuro...

A palavra esticava-se ouvido adentro:

Seu futurooo...

 

Ananias sentiu o gelo das pernas que subia pela espinha

A mão foi de súbito à cintura e levou o punhal ao peito da vidente

 

Ambos caíram

 

Ela foi levada ao hospital, onde morreu logo

Ele foi jogado na viatura e acordou preso
 
Elói Alves
 

 
Primeiro capítulo do romance As pílulas do santo Cristo:

 

terça-feira, 17 de junho de 2014

A CONDIÇÃO DE UM MORIBUNDO


Hoje fui ver o vizinho moribundo

Não sei se me notou

Entrei no quarto sozinho

Olhei-o por um tempo

Para ele talvez um tempo inútil

Para mim uma eternidade triste e impotente


Perguntei como se sentia

Não disse nada

Os olhos embranquecidos e aguados

A cabeça imóvel virada para o teto

Pode ser que não se sentisse

E sequer pudesse me ouvir


Aproximei mais e apalpei-o de leve

Apertei-o

Estava duro como cimento envelhecido

A pele gasta e ressequida cobria-lhe os ossos salientes



Depois de uma contemplação extensa

Me virei e sai calado

Era a extensão de minha comunicação com ele


Na saída, que dava para uma viela suja e estreita

Tropecei e pisei o rabo de um vira-lata que fugiu

Na rua uma algazarra febril festejava um jogo

Entrei em casa ainda roendo o meu silêncio frio
 
Elói Alves


Primeiro capítulo do romance As pílulas do santo Cristo:


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