Não quero ser preso por fazer apologia dos cheiros, mas nossa
cidade tem cheiro para todos os gostos - e para todos os desgostos também.
À entrada do shopping, a moça da loja de perfumes me convida, destacando mais sua beleza na simpatia do belo sorriso:
-Quer sentir?
-Sim, obrigado! - respondi, recebendo dela um pedacinho de papel perfumado.
O dela parecia mais agradável, dizia-me o meu olfato, comparando-o com a fragrância impregnada no papelzinho.
Trouxe-o comigo ainda por algum tempo, enquanto andava vagorosamente pela cidade. E meu olfato insistia sempre na comparação.
-Qual seria o perfume dela, perguntei-me, por fim?
Minhas reflexões foram interrompidas bruscamente pela fumaça do cigarro de uma mulher que veio olhar uma vitrine da loja de joias ao meu lado. Tentei ainda olhar uma flor coberta por ouro, mas meus pés ligeiros foram embora, na intriga dos sentidos, arrastando meus olhos que insistiam em olhar aquela bela flor, tão ricamente dourada.
Ao meio dia, fui encontrar ao pé do Teatro Municipal meu amigo Edu Moreira, que chegara de Portugal com novidades literárias.
-O velho continente continua lindo e pomposo - disse-me entre conversas diversas. Vamos sentar que quero lhe mostrar uma relíquia de Antero de Quental.
Estávamos na rua Formosa, no Vale do Anhangabaú, peripateteando, quando achamos uns bancos solitários em meio aos transeuntes.
Antes de sentar, verifiquei que estavam sujos e atravessamos a calçada em direção a uns assentos no lado oposto.
-O cheiro aqui não anda agradável, disse-me o Edu.
-E olha que o caminhão-pipa limpa isso todas as manhãs, com jatos fortíssimos. Vejo-o de minha janela todos os dias.
Fomos andando, cruzando o Vale em direção ao Mosteiro quando um leve vento espalhou pelo ar, mesclada às aromáticas sensações vindas das árvores de eucaliptos, a notificação de que fumavam livremente cigarros artesanais e proibidos. Mais à frente, a improvisação de um sanitário em espaço aberto misturou o cheiro de suas defecações com o da erva tragada. E subiam aos nossos narizes como incenso inaceitável. Não éramos deuses, certamente, para receber aquela estupenda oferenda!
Na Líbero Badaró fomos, no entanto, agraciados com os perfumes mais agradáveis que usavam os transeuntes em passeio na hora do almoço. Além do perfume, a elegância e a beleza lutavam para limpar minha mente dos odores maléficos. Para, ao fim, se dizer: “Compensa!”
Mas, infelizmente, com tantos perfumes, não sei com qual deles, minha alergia atacou-se. Almocei mais rápido que do costume, agradeci ao Edu sua gentileza e voltei para meu apartamento, para purificar-me sob as intensas águas do meu inodoro chuveiro.
Elói Alves
À entrada do shopping, a moça da loja de perfumes me convida, destacando mais sua beleza na simpatia do belo sorriso:
-Quer sentir?
-Sim, obrigado! - respondi, recebendo dela um pedacinho de papel perfumado.
O dela parecia mais agradável, dizia-me o meu olfato, comparando-o com a fragrância impregnada no papelzinho.
Trouxe-o comigo ainda por algum tempo, enquanto andava vagorosamente pela cidade. E meu olfato insistia sempre na comparação.
-Qual seria o perfume dela, perguntei-me, por fim?
Minhas reflexões foram interrompidas bruscamente pela fumaça do cigarro de uma mulher que veio olhar uma vitrine da loja de joias ao meu lado. Tentei ainda olhar uma flor coberta por ouro, mas meus pés ligeiros foram embora, na intriga dos sentidos, arrastando meus olhos que insistiam em olhar aquela bela flor, tão ricamente dourada.
Ao meio dia, fui encontrar ao pé do Teatro Municipal meu amigo Edu Moreira, que chegara de Portugal com novidades literárias.
-O velho continente continua lindo e pomposo - disse-me entre conversas diversas. Vamos sentar que quero lhe mostrar uma relíquia de Antero de Quental.
Estávamos na rua Formosa, no Vale do Anhangabaú, peripateteando, quando achamos uns bancos solitários em meio aos transeuntes.
Antes de sentar, verifiquei que estavam sujos e atravessamos a calçada em direção a uns assentos no lado oposto.
-O cheiro aqui não anda agradável, disse-me o Edu.
-E olha que o caminhão-pipa limpa isso todas as manhãs, com jatos fortíssimos. Vejo-o de minha janela todos os dias.
Fomos andando, cruzando o Vale em direção ao Mosteiro quando um leve vento espalhou pelo ar, mesclada às aromáticas sensações vindas das árvores de eucaliptos, a notificação de que fumavam livremente cigarros artesanais e proibidos. Mais à frente, a improvisação de um sanitário em espaço aberto misturou o cheiro de suas defecações com o da erva tragada. E subiam aos nossos narizes como incenso inaceitável. Não éramos deuses, certamente, para receber aquela estupenda oferenda!
Na Líbero Badaró fomos, no entanto, agraciados com os perfumes mais agradáveis que usavam os transeuntes em passeio na hora do almoço. Além do perfume, a elegância e a beleza lutavam para limpar minha mente dos odores maléficos. Para, ao fim, se dizer: “Compensa!”
Mas, infelizmente, com tantos perfumes, não sei com qual deles, minha alergia atacou-se. Almocei mais rápido que do costume, agradeci ao Edu sua gentileza e voltei para meu apartamento, para purificar-me sob as intensas águas do meu inodoro chuveiro.
Elói Alves
Leia o primeiro capítulo de As pílulas
do Santo Cristo romance de Eloi
Alves:
http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/10/as-pilulas-do-santo-cristo-1-capitulo.html
http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/10/as-pilulas-do-santo-cristo-1-capitulo.html
Abaixo, pode-se ler também o prefácio feito pelo escritor e mestre em Literautra Comparada pela FFLCH-USP prof. Edu Moreira: http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/11/prefacio-de-as-pilulas-do-santo-cristo.html