quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O FEIO NO SUPERLATIVO

     O superlativo não convém aplicar-se à feiúra, nem o analítico e tampouco o sintético, cuja compressão, neste caso, suprime a beleza que configura-se em massa, disforme e densa. Mesmo que vista-se com o disfarce eufêmico e colorido da fealdade, torna-se desumana ou no mínimo deselegante.
     Para que classificar a feiúra em graus e degraus que a intensificam mais e mais, como se ser feio estritamente já não bastasse? Para que dizer que alguém é muito feio, ou muitíssimo feio, feiíssimo?
     O superlativo tem seu assento assente nos meios denominados cultos e atribuem-se belezas e elegâncias diversas. No entanto, seu uso pode andar por via reversa. O cruel tem se tornado cruelíssimo e até de modo cru vestido-se de crudelíssimo, mas vem sempre triste, choroso e mal vestido, andarilho de via obscura.
     O nazismo, na Alemanha, o fascismo, na Itália e para onde correu depois e perambula hoje, são dessas molduras. A intensificação do adjetivo leva sempre a eterna pergunta: para que? Para que romper-se mortífero, já no desumano e em si extremado, dos venenos atômicos que emudecem a história?
     “Os pobres sempre estarão convosco”, diz Cristo aos discípulos- mas para que se fazem paupérrimos? Para que as as distâncias econômicas se agigantam tornando os miseráveis miserabilíssimos?
       A questão lingüística torna-se mera capa da essência atrofiada pela hipertrofia. Esticam-se superlativamente os mentirosos, os ratoneiros- lábio-disfarçantes- em crudelíssimos enganadores, em ancestrais do pai da mentira que incham em grau extremo as casas parlamentares e executivas, carcomidas por todos os vícios.
      A metáfora da miséria são os ossos secos que insistem em por-se de pé. Sua insistência é a pregação muda e corrosiva que penetra pela história, que tentam maquiar inutilmente os políticos com seus discursos e propagandas de “paz e amor” e promessas salvadoras. A história tem seu subsolo descolorido, impermeável às tinturarias da propaganda. Suas tintas perecem com sua passagem fétida.
     Para que roubar superlativamente um país inteiro? Infectar todo um organismo com mazelas apadrinhadas, de bocas roedoras? Por que não contentar-se com ações apenas feias? É preciso levá-las a semântica do horrendo sem abrir mão do radical?
     Sou pelo meio-termo, uma posição mediana entre o santo e o pecador: para que se vestir de deuses se sabemos- até pelo cheiro- que os diabos perfumam-se com enxofre e trazem a cara horribilíssima, maquiada superlativamente com as cores da incoerência?
Elói Alves

Leia o primeiro capítulo de As pílulas do Santo Cristo romance de Eloi Alves:
http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/10/as-pilulas-do-santo-cristo-1-capitulo.html

Abaixo, pode-se ler também o prefácio feito pelo escritor e mestre em Literautra Comparada pela FFLCH-USP prof. Edu Moreira: http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/11/prefacio-de-as-pilulas-do-santo-cristo.html

Adquirir o livro:http://realcomarte.blogspot.com.br/p/as-pilulas-do-santo-cristo-adquiri.html

2 comentários:

  1. Nossa língua tem destas coisas, não basta usar uma palavra para se expressar é necessário aumentá-la ou as vezes até diminui-la para se fazer entender ou dar uma enfase enorme a determinado evento. No ingles isso nao acontece, basta acrescentar uma palavra ao lado ou acrescentar um sufixo e pronto! um carro torna-se um carro pequeno (car e little car) o superlativo é feito por poucas palavras que se agregam a palavra e está feito o que vc quer enaltecer ou derrubar(big -biggest/ beautiful-the most beautifiul, assim, simples, sem medo de ser feliz. E ser feio ou não, é algo absolutamente desnecessário de se superlativar, mesmo por que o que é feio para mim é bonito para vc, somos seres semelhantes nunca fomos iguais, algum louco inventou esta história de ser igual a todo mundo rsrs. E cá pra nós ninguém precisa ser bonito, veja que as mulheres (digo com propriedade) escolhem, escolhem homens bonitos, deuses gregos, apolos e acabam com um servo da história, um escravozinho feinho (usando o recurso para amenizar a feiúra rsrs) porém este feinho é gostosinho hahaha e isso é o que interessa no fim das contas, claro que isso se aplica às mulheres também, quem já não ouviu dizer que "panela velha é que faz comida boa"? ou quem ama a feia bonita lhe parece? Príncipe Charles que o diga, o chifre mais revoltante do mundo!! kkkkkkkkk. Feio e horrendo mesmo é roubar descaradamente e chamar de Esperança. Esperança de bolsos cheios!

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    1. Muitíssimo grato Jane por ampliar o tema com seu comentário sempre rico e dialogando profundamente com o assunto, com seu estilo. Beijos gratos, querida!

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