As
páginas seguintes formam o primeiro capítulo do romance de minha autoria lançado pela Linear B Editora em novembro.
As
pílulas do Santo Cristo
Elói Alves
Linear B editora
© Elói Alves
1ª edição: novembro de 2012
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação – CIP
Doutores na delegacia
Quando
ingressei na universidade, eu tinha apenas dezessete
anos e estava totalmente perdido. Ainda nos primeiros
dias, travei amizade com um grupo de veteranos do curso
de medicina, de quem me acerquei por longo tempo. Era
o meu sonho ser médico, mas como não obtive nota suficiente
nos exames vestibulares, conformei-me com o curso de Direito,
que, àquela época, exigia nota inferior.
Andei
muito apegado a esses meus colegas. Era de causar
estranheza ao pessoal do meu curso, que, provavelmente, sentia-se preterido ou discriminado. Por longo tempo, acompanhei-os
nos cafés e nas festas. Gostava também de vê-los
vestidos de branco. Estavam entre esses os melhores amigos
que reuni durante os anos que passei na universidade.
Um
dia, sem o mínimo aviso, alguns deles sumiram. Era
comum que um ou outro desaparecesse por uns dias, ocupado
em quaisquer afazeres; no entanto, desta vez, houve um
grupo que resolveu ausentar-se ao mesmo tempo, sem que eu
tivesse noção alguma de onde andavam.
Alguns
meses depois, numa manhã antes das aulas, sendo
aquele o quarto ano de minha graduação, vieram me trazer,
no saguão de entrada, os jornais do dia, com uma notícia estarrecedora.
10
. As
Pílulas do Santo Cristo
− Olha
quem está preso!- disseram-me.
Eram
três dos meus amigos mais próximos, todos do curso
de medicina. Peguei os jornais e os li rapidamente, ali mesmo
de pé.
− Mas
não será engano? − perguntei, sem convicção.
− Que
nada !− disse-me um companheiro de turma. Aí
diz tudo. Estão numa geladeira! Foram presos em uma delegacia
próximo da Sé. Estelionato, curandeirismo, falsificação
de remédios. Enfim, pegam pelo menos uns dez anos cada
um. Se já estivessem formados, teriam subterfúgio
jurídico. Mas
ainda precisam de uns seis meses para colar grau.
Desisti
imediatamente das aulas e me dispus a ir à delegacia.
Provavelmente, nem suas famílias, que eram do interior,
estivessem já informadas. Na saída, peguei ainda uma gravata
com um amigo e coloquei-a no pescoço. Era preciso que
me apresentasse adequadamente.
Durante
o caminho, fui montando uma defesa possível. Não
me parecia haver necessidade de um pedido de habeas corpus,
todavia, fui conjecturando algumas ideias básicas, assentes
no Direito e que vinham à ocasião. Tinham residência fixa, sem antecedentes criminais, não eram delinquentes que
apresentassem periculosidade, eram estudantes de uma universidade
pública, em um curso de alta relevância social. Porém,
o problema maior era se ficassem detidos. Como não tinham terminado
o curso, seriam postos em uma cela comum, com dezenas
de presos por metro quadrado.
Não
sei como me lembrei naquele instante de que a universidade dava um
documento com status de provável bacharel ao aluno de último
ano. Aferrei-me a esta nomenclatura e me preparei para enfrentar
o delegado.
Quando
cheguei à delegacia, os três tinham sido levados a
uma cela, onde havia também outros presos. Apresentei-me e pedi
para ver meus clientes.
− No
momento será impossível, doutor!- disse-me o delegado.
− Como,
doutor? − devolvi-lhe, mas sem desafiá-lo. Meus
clientes não se negam a responder à justiça nem pretendem
obstar o trabalho do Ministério Público, mas devem ter
o benefício que a lei lhes outorga. Ademais, são
prováveis bacharéis
de uma universidade pública.
Fiz,
propositadamente, mais sonoros os termos bacharéis
e universidade pública, no entanto, o delegado interrompeu-me.
− Seja
como for, doutor. Veja o barulho que o caso está fazendo,
os jornais da cidade e até os protestos da Igreja.
− Não
nego, doutor! − retruquei, retomando a palavra. Apenas lhe digo, com a
devida vênia, que observe o fato de que meus clientes não possuem
antecedentes, têm origem em famílias de cidadãos decentes
e uma formação que será útil à
sociedade. Além disso, todos
têm residência fixa e responderão aos chamados
que lhes fizer a justiça. Com a máxima licença, doutor, não
havendo decisão
judicial em contrário, o que se impõe no momento é impetrar
a fiança e dar-lhes a saída, para que aguardem em liberdade
a tramitação do inquérito, que, além do
mais, meus clientes
não podem permanecer em prisão comum.
Nesse
instante, o delegado recebeu a notícia de que haviam
roubado um banco praticamente contiguo ao estabelecimento policial,
onde havia reféns e um soldado, seu subordinado, tinha
sido ferido. Em questão de segundos, ele colocou o
paletó, pegou a arma e correu a uma sala adjacente. Depois voltou
às pressas, chamando os policiais que o acompanhavam:
− Rápido!
Rápido! Vamos!
Já
fora, aparecendo à porta, gritou a seu auxiliar para que
providenciasse a soltura dos estudantes, de acordo com a lei
e pagando a fiança.
Na
rua, a confusão era grande. Por todas as partes, viam-se
policiais com fuzis nas mãos e viaturas estacionadas, além
de outras que chegavam com sirenes ligadas. O trânsito, totalmente
parado, ia sendo desviado para ruas paralelas por policiais
e por agentes da Companhia de Tráfego. Ao redor, o
povo, apesar dos cordões de isolamento que bloqueavam a passagem,
ia enchendo as ruas e as calçadas para conhecer o que
acontecia.
Caminhando
com os três, pelas vias do centro da cidade,
agora mais solto e aliviado, atendi o organismo que me
lembrava de verificar as horas. Olhei no pulso esquerdo, os ponteiros
abraçavam-se afetuosamente no meio do dia ao som rítmico
dos eternos tic-tac. A propósito, convoquei os amigos com
uma pitada de malícia:
− O
almoço fica por conta dos meus clientes!
Adquirir exemplar do livro:
Ler o segundo capítulo de As pílulas do Santo Cristo no link: http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/10/as-pilulas-do-santo-cristo-2-capitulo.html
Quero tudo!!!! Envolvente...quero mais!!! o único pecado é não ter conseguindo não ver neste personagem incorporado a sua doce figura amigo! rs Parabéns... rápido publique, tenho pressa!
ResponderExcluirNão sei se seu desejo de doçura aparecerá, Ira (veremos rrsrsrs), mas o advogado tem uma papel fundamental na narrativa, justamete, é quem a faz; no entanto, como você verá, e ele já disse acima, é um simples e feliz observdor dos médicos no meio dos acontecimentos, muito longe da ação dos outros.
ExcluirNão aguça ainda mais minha enorme curiosidade! rs
ResponderExcluirPelo jeito esse livro promete !! começou a me prender logo no primeiro capitulo,fiquei com sede de mais kkkkk posta logo o próximo capitulo !!!!
ResponderExcluirParabéns Eloi,beijos.
Muito grato, Rosi, pela leitura, ótimo que tenha gostado; bjos!
ExcluirEloi, deixei para ler com tempo.Mas a curiosidade não me permitiu. fiquei presa ao texto muito bem escrito e e peguei curiosa para ver mais.
ResponderExcluirParabéns!
Grato, Beth, já tem aí o segundo capítulo, onde a narrativa efetivamente inicia-se, pois que o primeiro funciona como uma epígrafe narrativa; abraço
Excluir