Atendi com alegria o pedido do escritor Décio Scaravelli para
prefaciar seu belíssimo livro "Os contos do pássaro", que em breve
virá a público, pela Editora Essencial. Os queridos amigos que queiram conhecer um pouco do livro do
Décio tem a seguir o brevíssimo prefácio. Muito Obrigado ao autor pelo gentil
convite e aos leitores pelo carinho da leitura.
Elói Alves
As
saborosas histórias que se desenrolam no presente livro, do escritor Décio
Scaravelli, se filiam a uma antiga tradição narrativa cuja estratégia de ficção
literária nos surpreende de tempos em tempos, como se observa na clássica e encantadora
história de Mário de Andrade: “só o papagaio no silêncio do Uraricoera
preservava do esquecimento os casos e a fala desaparecida. Só o papagaio
conservava no silêncio as frases e feitos do herói”.
Aqui,
aliás, o narrador ressurge em um sabiá, tão decantado como “cantor da estação
do amor”, que parece beber das doçuras de Macunaíma, evocando inspiração à
estatua de Camões e fazendo seu ninho junto à casa das histórias, essa célebre
biblioteca paulistana, cujo nome lhe empresta o autor de nosso “herói sem
nenhum caráter”, em que tantos intérpretes vislumbram, sabe-se lá com quantum
de razão, a personificação do brasileiro.
A
própria oralidade e a tradição popular se fazem devotas do ofício dessas aves,
pois, na ausência de outra fonte fidedigna para suas histórias e saberes, se
dizia: “um passarinho me contou”. Mas foi nas obras mais sublimes de nossa
literatura que se viu e ouviu cantar essa “ave que reza muito”, como se traduz
do tupi, pois, assim, vem ela figurar numa “terra que tem palmeiras”, onde está
a cantar”, e, no triste exílio do poeta, as aves que lá “gorjeiam” não o fazem
como nosso canoro sabiá.
A
mesma ave narradora, a propósito do amor de Dante, que abre as narrativas do
livro, poderia evocar os versos de Bandeira: “Passarinho... minha canção é mais
triste...”. No entanto, às lágrimas do poeta, que lhe caiam como se fossem a
música suplicante do mágico Gonzaga: “alivia minha dor, sabiá, diga onde anda
meu amor”, a personagem do pássaro-narrador lhe toma seu lugar no inferno
da imobilidade fria e petrificada em que jazia como obra de arte, dá-lhe animus
vivendi, manda-lhe purgar pelas ruas sinuosas dos
desencontros citadinos, até que se depare com Beatriz, e nela encontre o seu paraíso,
numa analogia à obra maestra que nos deixou Alighieri na Divina Comédia,”
o poema dos poemas”, no dizer de Schelling.
A
todos os leitores que se deleitem dessas belas narrativas de Contos do pássaro.
Elói Alves é advogado, atuante em SP, e prof.,
formou-se em Letras pela Universidade de São Paulo-USP e em Direito pela FMU, é
autor, entre outros, dos livros O olhar de lanceta: ensaios
críticos sobre literatura e sociedade e do romance As pílulas
do santo Cristo; foi revisor de importantes obras jurídicas e
literárias. Email:
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