O título acima lembra, por um lado,
uma singela brincadeira de jogo de palavras - em que mudando-se a posição das mesmas,
muda-se seu significado - e revela, de outro modo, a horripilante maneira
como as questões políticas, que mexem profundamente com o modo de vida das pessoas,
são levadas sem a mínima seriedade necessária, por ampla parcela dos políticos e
por considerável parte sociedade brasileira.
A
propósito disso, viralizou nas redes sociais um vídeo de curtíssima duração, em que um
político mineiro, ex-vereador, e agora deputado, ao tomar posse, tentava ler
o juramento à Constituição, condição para que fosse empossado. No vídeo, cujo
link ponho abaixo, ele troca a palavra Constituição e, sem ler integralmente
três ou quatro palavras, desiste do juramento, afirmando “não ter
importância”.
A
Constituição da República Federativa do Brasil,
Lei maior que se impõe a todo ato público e privado no território nacional, afirma que “São inelegíveis os analfabetos” (CF, Art. 14, $ 4º) e voto facultativo
para os analfabetos (CF, art. 14, $ 1º, II a). O que espanta, no entanto, é que
reiteradamente pessoas em tais condições são eleitas para uma função pública
cujo ofício principal é exatamente fazer leis que impactam obrigatoriamente toda a vida das pessoas, além da função de fiscalizar a máquina administrativa sob o Poder Executivo,
sem os instrumentos de uma formação básica, rudimentar e fundamental para o bom exercício das
atividades legislativas, em afrontoso desrespeito à Lei Maior do país.
A
culpa não é apenas dos políticos iletrados, individualmente – políticos que apesar
de analfabetos têm, no entanto, suficiente capacidade de convencer pessoas sem
consciência de suas responsabilidades cívicas. O erro é, antes, das organizações
partidárias, que no Brasil gozam de larga proteção legal e, quando se emporcalham,
basta trocar a sigla, ou nome do partido, para estar limpa.
A
lei deveria ser rígida a ponto de banir as siglas partidárias e seus líderes da
vida pública quando não agem de acordo com a decência e o bem público. No caso, é
muito simples, no momento da filiação partidária, que deve, por Lei, vir muito
antes da escolha de seus candidatos, objetar a pretensão à candidatura se o
pretenso filiado não for alfabetizado. Seria simples, também, ensiná-lo a
escrever, ler e interpretar minimamente, e a fazer algumas continhas no
papel, nas próprias dependências do escritório partidário, contratando-se, para
isso, infelizmente por quase algumas moedas, algum professor de português. No entanto, isso não interessa, para eles, e, tristemente, para muito mais gente.
Por
último, deve-se dizer, a conta é também da sociedade, no que toca ao
analfabetismo político, que se verifica na ausência de consciência política, no
desinteresse pelas questões fundamentais da vida pública. Na verdade, o
político analfabeto e o analfabeto político se complementam, se retroalimentam.
Ambos sofrem do mesmo mal e a diferença cruel está no aproveitamento por aquele da situação pela via, digamos, de certa malandragem ou, ainda e também, de sua
instrumentalização pela organização partidária como puxador de votos para a
legenda. (Não custa lembrar que pior que tá não fica)
Lamentavelmente
os índices de analfabetismo funcional (os que leem, mas não entendem o que leem) e
político são, segundo o IBGE, altíssimos no país. São uma grande mazela de fazer
chorar, e não de rir, como faz o político ao não conseguir ler três palavras de
seu próprio juramento de posse, que um medíocre assessor o faria decorar em casa. Aliás, fico mesmo sem saber se ele ri, então, de si ou dos
outros analfabetos políticos de seu estado e do país.
Elói Alves
Vejam o vídeo pelo link abaixo
Texto verdadeiro. Atual e atualizável por muitos e muitos anos, crítica perfeita.
ResponderExcluirMuitíssimo grato, Elisabeth, por sua preciosa leitura e por seu gentil comentário; grande abraço
ExcluirInfelizmente não é o único,cresce assustadoramente o número dos tais que são cidadãos de bem,boas condutas,caridosos,mas não deveriam chegar a esta posição,onde não terão capacidades de ter suas próprias conclusões sobre determinados assuntos( nem mesmo ler um simples discurso,que por certo não foi o autor) e desse modo serem subjugados e levados a "dançar" em outros ritmos,mas na verdade quem acaba dançando literalmente,é o sofrido povo que os elegeram.Ótimo texto,Elói!
ResponderExcluirMuitíssimo obrigado, minha especial amiga Marilene, por sua leitura e por ampliar a texto com sua reflexão e análise cívicas; abraços gratos, amiga.
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