Entre
os antigos a ideia do tenebroso, dos terríveis eventos
inesperados mas temíveis, tinha sua ocorrência associada
às horas noturnas, ao momento sagrado do sono reparador que
aliviava os homens do trabalho árduo e dignificante,
geralmente ligado à terra, à plantação e
à colheita.
Nos
textos antigos do Velho Testamento, que dista milênios de nossa
época, há um trecho, entre tantos, que ilustra essa
ideia: “guarda, o que houve de noite?”, grita a voz desesperada,
sem no entanto ter resposta alguma que a acalmasse. Este trecho,
registrado por Isaías, associa-se a outros, como em partes dos
evangelhos sinóticos, onde o ladrão vem sempre à
noite, e a esta se referem todas as metáforas das trevas e da
escuridão.
Mas
em nossos tempos não há hora para que o mal apareça
e nos atinja. Ao contrário, ele está instituído
com toda a roupagem da legalidade e das pompas formais. Está
embutido no preço final que é preciso pagar em cada
parte, parcelado por toda a vida e sentido a acada momento. O próprio
Estado, que era a grande esperança de salvação
para os antigos, uma vez que se concretizasse como um Reino de
Justiça, é hoje quem protege e incorpora a classe
política - torta de corpo e fétida de alma.
Vários
historiadores, como também o famoso pensador Max Weber em sua
Ética protestante e o espírito do capitalismo,
mostram em que base se inspirou a formação do Estado
norte americano, em suas origens, em que os puritanos, opondo-se aos
capitalistas aventureiros do sul, procuraram erguer uma nova pátria
fundada na ética ascética secular em que é
preciso se superar sempre, com dedicação vocacional ao
trabalho e ao lucro extraído dele. Para os puritanos
fundadores dessa ética, até os ricos devem comer de seu
dedicado trabalho.
Disto
separamo-nos sempre, desde o início da colonização,
onde sempre valeu e vale a exploração aventureira, egoista e corrupta; onde o mal do outro vale
dinheiro para tantos, onde as desgraças rentáveis se
dão cotidianamente, onde a ética da dignidade pessoal
não alastra-se, onde as catástrofes geram oportunidade
de aparecer, de se fazer novas promessas, de se falar em punir os corruptos,
de se falar em eliminar as facilidades viciadas que duram apenas até se
esfriar o corpo das vítimas, até o momento em que as
notícias perdem o interesse e se dirigem a outros males novos.
Aí é a hora de esperar - e até de causar - outra
desgraça para tornar a aparecer à imprensa "como gente que faz", e para esta
lucrar, porque, afinal, uma má notícia é uma
“boa notícia”, isto é, uma notícia
lucrativa.
Elói
Alves
Leia o primeiro capítulo de As pílulas
do Santo Cristo romance de Eloi
Alves:
http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/10/as-pilulas-do-santo-cristo-1-capitulo.html
Abaixo, pode-se ler também o prefácio feito pelo escritor e mestre em Literautra Comparada pela FFLCH-USP prof. Edu Moreira: http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/11/prefacio-de-as-pilulas-do-santo-cristo.html
http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/10/as-pilulas-do-santo-cristo-1-capitulo.html
Abaixo, pode-se ler também o prefácio feito pelo escritor e mestre em Literautra Comparada pela FFLCH-USP prof. Edu Moreira: http://realcomarte.blogspot.com.br/2012/11/prefacio-de-as-pilulas-do-santo-cristo.html
Que bom seria se pudéssemos apenas voltar aos tempos de plantio e colheitas...do SER e não do TER. Massacrados porinteresses mesquinhos que brotam como erva daninha corrompendo-nos e nos desumanizando.Tecnologia inovadora, consumismo exacerbado, pilulas da felicidade vendidas em farmácias, tarjas pretas ou cachimbos nas calçadas.
ResponderExcluirE mesmo não sendo "ainda" carnaval, abram alas para nossa Presidente na tragédia de Santa Maria enquanto o Prefeito da a gora famosa cidade diz não ter conhecimento téfcnico para reconhecer que apenas uma porta nunca será suficiente para 2000 pessoas em caso de sinistro! Tempos tenebrosos
É meu amigo realmente hoje tá tudo invertido kkkk e hoje por coincidência uns minutos antes de receber esse texto,estava refletindo justamente sobre as más noticias que são dadas pela TV,e que fazem o maior sucesso !! minha mãe é super ligada no Datena e Marcelo Rezende que são dois programas que só falam em desgraça kkk e repetem toda hora as tragédias de todos os ângulos , eu perguntei pra ela se não tinha outra coisa melhor pra assistir, já que eu estou passando roupa e a TV fica na minha frente,sabe o que ela disse ? " É obrigação nossa saber o que acontece ao nosso redor " kk aí eu perguntei ,e as coisas boas ? ela disse " A gente não precisa se defender de coisas boas " , com raiva dos meus comentários ela foi e pôs na novela kkk sem comentários.....Mil beijos Eloi.
ResponderExcluirPoxa Eloi que texto consciente e que nos faz desabafar nossa tristeza quanto a tudo o que ouvimos e vemos quando as notícias se repetem e ninguém nada faz para resolver de fato os velhos problemas.
ResponderExcluirO que manda no Brasil é o dinheiro e quanto mais fácil para rancar dos lombos dos outros, melhor.
Marilene Ribeiro (pelo facebook)"Espetacular texto,Elói Alves Do Nascimento!faz-nos "soltar" aquele grito na garganta,aliviar as nossa tensões ante a tão escabrosas atitudes ditas em favor do povo.Antes a sombra da noite é que assustava,trazendo insegurança,medo ,era esperar seguro em casa esperando o sol raiar.Agora,os lobos se vestem de cordeiros,o cheiro fétido os revelariam,mas suas artimanhas são grandes ,envolvendo e seduzindo a muitos.Muito bom,Abraços!"
ResponderExcluirA saúde trabalha assim. Não basta números estatisticos e provas de que precisamos mudar algo, precisa do impacto, precisa de fotos, imagens, catastrofes,acontecimentos. O acidente não existe, é dificil lidar com o imaginável, infelizmente nestes momentos é que recebemos alguma atenção e aproveitamos para mudar as coisas, por que como vc mesmo disse "até o corpo esfriar"... muita coisa muda até o próximo evento sangrento. Excelente reflexão.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirUma má notícia rende muto para quem lucra com ela e assim segue. Uma tragédia vai apagando a outra, nada mais é preciso fazer para mudar aquilo que já foi esquecido e assim as atenções vão sendo desviadas.
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